quinta-feira, 30 de março de 2023

Em Todos os Sentidos - 32, a

 


32 ~ A Rapariga dos Fósforos

Pertenço a uma geração de crianças que leram A Rapariga dos Fósforos. (…) (201)

 

Também eu. Histórias de Hans Christian Andersen que me encantavam, me faziam sonhar e muitas das quais deixaram um rasto longo e emotivo que chegou até hoje. Tal como se pode deduzir que aconteceu a Lídia Jorge (ver a sua última afirmação desta sua crónica).

 

Antes de passar à crónica de Lídia Jorge, partilho a notícia cuja foto escolhi para encimar este meu comentário:

Em Gaia existem 4492 crianças em situação de pobreza extrema, afirmou a ministra do Trabalho e da Segurança Social, Ana Mendes Godinho (...) sublinhando que a nível nacional o número ascende às "170 mil".

Saliento que não se trata de pobreza simples, estamos a falar de «pobreza extrema»! Eu nem faço ideia do que esta expressão quer dizer na prática real e concreta do dia-a-dia. Nem consigo imaginar, só no nosso país dos lucros fabulosos das grandes empresas e bancos, o que são 170 mil crianças!

Sim, em 2023, num país civilizado e numa das regiões mais civilizadas e desenvolvidas do mundo, temos pelo menos 170 mil “raparigas dos fósforos”!

E, para estas crianças, sair da pobreza é fácil? Não, não é. Em Portugal, demora em média 5 gerações, mais de 100 anos, como indica o Relatório da OCDE de 2018:

 



Talvez não por acaso, Hans Christian Andersen percebe que a única solução para a sua heroína (sim, escolho intencionalmente esta palavra “heroína”, pois é o que são verdadeiramente todas estas crianças!) é a morte.

Muitas crianças no nosso país seguem o seu exemplo: “Suicídio é a principal causa de morte em crianças e jovens adultos em Portugal”. E, hoje em dia, cada vez mais crianças, e cada vez mais novas, tentam suicidar-se.

Lídia Jorge chorava e continua possivelmente a chorar, como muitos de nós.

(continua em 32, b)


Em Todos os Sentidos - 32, b

 

(foto tirada daqui)


(…) Nessa altura as crianças choravam mas ninguém se importava com o motivo do seu choro. (…) (201)

A educação antiga visava (mesmo quando as pessoas não tinham consciência disso) objetivos impostos pela cultura dominante. Alguns desses objetivos tinham a ver com o facto de o poder pretender cidadãos preparados para ir para a guerra.

A guerra exige uma dureza e uma ausência de sentimentos (matar alguém da nossa espécie que nunca vimos e que nunca nos fez mal, nem nos ameaçou, é algo de absolutamente contra natura). Logo, a educação dada procurava que, desde pequenas, as pessoas se habituassem a reprimir as suas emoções mais humanas, transformando-as em pequenos monstros. Podemos dizer que, durante séculos, o ser humano foi bem sucedidos nessa finalidade.

Por isso, não se procurava dar nenhum conforto especial quando a criança ficava triste, por exemplo. Aliás, nos rapazes, tal coisa era francamente desaprovada até muito recentemente: por exemplo, “um rapaz não chora!”

Hoje vemos resquícios ainda significativos desta situação. Nomeadamente, por parte de pessoas que acabaram por interiorizar a educação que tanta solidão e tanto sofrimento lhes trouxe.

Só assim se pode compreender, face ainda à infinidade de maus tratos que atingem as crianças, tanto no nosso país como no mundo, a afirmação pública (eu estava lá e assisti) feita por um jornalista e escritor famoso de que “atualmente, há uma preocupação doentia com as crianças”.

 

(…) Criança era então uma pequena criatura que quase todos os dias chorava. (…) (201)

Aos olhos dos adultos, podia ter razão para isso ou não. Mas ela, ela sabia o que sentia; e, às vezes, até sabia a razão, como no caso de Lídia Jorge.

Quando é que uma pessoa adulta chora? Podemos chorar de felicidade, mas o mais comum é chorarmos de tristeza, de frustração, de medo ou de raiva. E quando é que isto acontece?

Quando vivemos eventos (externos ou internos) dolorosos, como uma perda, uma morte, uma violência ou qualquer outra situação dramática (como sabemos, podemos nem estar a viver essa situação, mas apenas a assistir a ela, como é o caso aqui contado por Lídia Jorge).

Genericamente, sentimo-nos assim quando os outros nos tratam mal ou tratam mal alguém que amamos. Ou seja, quando há uma violência (ativa ou passiva) no contexto de um relacionamento.

Ora, a questão que se impõe é: Porque havemos de pensar que as crianças são diferentes dos adultos? Porque é que não lidamos com o seu chorar como o fazemos com um adulto?

Estas são interrogações que cada vez mais me deixam conturbado. Até porque sabemos que as crianças têm menos experiência, menos saber e menos defesas em relação àquelas situações do que um adulto. Isto é, a haver uma diferença entre adulto e criança, é no sentido de aquelas emoções serem muito mais perturbadoras para a criança do que para o adulto. E, portanto, ela precisar muito mais de conforto do que o adulto. Então, porque desprezamos estas emoções na criança?

Quando penso nisto, lembro-me de que até há relativamente pouco tempo também se desprezavam estas emoções nas mulheres. Dizia-se delas que eram “o sexo fraco” (não serão ainda vistas assim, hoje, por muitos?) Porque elas eram consideradas seres inferiores aos homens. Porventura, consideraremos ainda hoje as crianças essencialmente inferiores aos adultos?

Mas com as crianças há ainda uma outra agravante. Há um ponto em que, pelo menos, todas as correntes psicológicas estão de acordo: seja o que for que fizermos (ou não) às crianças, isso terá impactos profundos e duradouros para toda a sua vida. E, claro, para aqueles que os rodeiam mais de perto.

Portanto, não percebo.

(continua em 32, c)


Em Todos os Sentidos - 32, c

 



(…) Imaginava soluções para a sua vida miserável (…) (201)

Sim, as crianças têm em elevado grau sentido moral, empatia e compaixão. A menos que os cuidados que receberam e continuam a receber primem pela ausência ou ela seja mesmo maltratada (que é o caso de uma infinidade de crianças, hoje em dia.

Esta confissão de Lídia Jorge demonstra indiretamente que recebeu os cuidados devidos na altura certa. Foram todos bons? Provavelmente não, já que não há pais (ou educadores) perfeitos. Mas até é bom que essa perfeição não exista, pois a criança cresce e ganha maturidade também quando se esforça por procurar satisfazer as suas necessidades que não estão a ser cuidadas como ela desejaria (desde que as suas necessidades básicas se encontrem satisfeitas, claro está!).

 

Lídia Jorge, muito acertadamente, considera que ajudamos quem precisa porque isso dá um sentido à nossa vida e não simplesmente pelo prazer de o fazer. No entanto, este prazer não é uma criação nossa. Todos nós nascemos com esta característica: numa espécie tão social como a nossa (em que a sociabilidade é, e sempre foi, o fator mais necessário e importante para conseguirmos sobreviver, desde bebés até velhos), o nosso organismo recompensa-nos com sensações agradáveis e com bem-estar qualquer iniciativa nossa mais pró-social. Não é algo que possamos suprimir.

Acrescenta também Lídia Jorge que não devemos sacrificar pessoas no presente em nome de uma qualquer utopia do futuro, algo com o qual também concordo inteiramente. Ah, claro, tudo isto é dito da forma superior com que Lídia Jorge escreve e não desta maneira seca e pobre com que eu o faço.

 

Lídia Jorge põe, em seguida, o problema de sermos enganados por pessoas que falsamente nos solicitam ajuda mesmo quando não precisam dela; ou quando, pelo menos, podiam fazer qualquer outra coisa para se ajudarem a si próprias sem estarem a espoliar indevidamente os outros.

É verdade, como em tudo no mundo, há sempre quem se aproveite. Eu resolvi o problema da seguinte maneira.

Dar ou não dar é um problema que é só meu, é da minha exclusiva responsabilidade. Que eu resolvo normalmente dando porque é isso que me traz mais sentido à minha vida do que não dar. 

Quando dou, aquilo que dou deixa de ser meu, naturalmente. Logo, o que a pessoa faz com o que eu lhe dei já não é da minha conta, não é um problema meu, mas um problema dela. Eu fiz a minha parte da obrigação; ela, da sua parte, fará o que entender, isso já não pertence à minha equação (a menos que ela use o que lhe dei para fazer mal e prejudicar outros).

É uma solução perfeita? Não. Logo à partida porque posso estar a desperdiçar recursos que poderiam ser muito mais úteis para quem realmente precisa. E, depois, porque estou a alimentar a fraude, eventualmente até a fazê-la crescer. Mas não há maneira de ultrapassar esta dificuldade.

A recusa em dar ajuda não me parece uma solução para este dilema, é apenas uma forma de o evitar, de fugir a ele. Eu opto por assumir a dúvida e as sensações desagradáveis consequentes (principalmente, quando descubro que fui enganado, como Lídia Jorge suspeita razoavelmente que o foi).

No fim de tudo, perguntar-me porque é que dou é quase o mesmo que perguntar-me porque é que ando: porque posso fazê-lo e isso me serve bem.

Devo acrescentar que, aqui, fui muito influenciado pela extraordinária peça Huis-Clos / À Porta Fechada, de Jean-Paul Sartre (Artistas Unidos / Livros Cotovia, 2013). Nesta peça discute-se muito esta questão do que somos, de como os outros nos veem e de como nós nos avaliamos. Sartre, na voz de uma das suas personagens, Inês, propõe que:

Só os actos decidem aquilo que quisemos (sic). (p. 51 da edição referida acima)

 

(…) Chego à conclusão de que ninguém consegue apagar os livros que lê na infância.


domingo, 18 de dezembro de 2022

Misericórdia

 


D. Quixote, 2022


(A apreciação desta obra foi dividida em três partes, das quais esta é a primeira; a segunda será "O Título" e a terceira "O Diálogo". Coloquei-as aqui de forma seguida, alterando as datas, exceto a desta publicação, para tornar sequencial e mais fácil a sua leitura.)


Vou falar aqui de uma obra extraordinária e fortíssima, talvez a maior até agora escrita por Lídia Jorge.


Disse Samuel Johnson que 

A writer only begins a book. A reader finishes it.

Eu talvez não dissesse que acaba, mas sim que continua, que todos os leitores continuam, tecendo uma rede de significados cada vez mais vastos e profundos que, depois, vão passando a fazer parte da própria identidade da obra. Foi isto o que senti nas duas leituras que já fiz deste romance. Aliás, a personagem da filha da narradora, que é escritora, pode estar também a sugerir o mesmo, quando diz (p. 88):

(…) - «Não é bem assim, os finais não são o fim dos livros…»

-

Lídia Jorge é a única autora, juntamente com Vergílio Ferreira, com quem me sucede ler um livro e, passados alguns dias, sentir uma vontade irresistível de fazer uma segunda leitura e até uma terceira ou quarta. Parece que sinto a suspeita de que ficaram coisas por apreender nas leituras anteriores, coisas que estão a exigir de modo premente a minha atenção e a minha reflexão.

Então, quando releio, nunca se me frustra a expetativa de descobrir ou de encontrar outros níveis de significação, normalmente mais profundos, que subjazem à obra e que me tinham escapado anteriormente.

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Mas o que se passou com Misericórdia foi algo de muito mais profundo que nunca me tinha acontecido antes: enquanto eu ia lendo, um desconforto profundo e antigo foi aflorando ao meu espírito. No princípio, atribuí-o ao facto de eu ter quase 65 anos e, portanto, os acontecimentos ali relatados surgirem já alarmantemente próximos aos meus olhos.

Depois, fui-me apercebendo da verdadeira causa desse desconforto (talvez também por breves sugestões feitas por Lídia Jorge ao longo do livro).

Aqui, um dos vários temas abordados consiste no facto de os velhos serem tratados muitas vezes como crianças (o que, diga-se de passagem, acontece na vida real, este pormenor não é uma ficção). Ver, por exemplo, na p. 226 - «como se fossemos seres humanos da primeira infância». Ou a reflexão feita por D. Alberti nas páginas 119 e 120. 

Então, ocorreu-me que as crianças são, por sua vez, tratadas como os velhos o são. Claro que teríamos de incluir aqui os maus-tratos. Apesar de este aspeto não fazer parte do livro, sabemos das notícias que há idosos a sofrerem de maus tratos que incluem a violência física.

Deste modo, tornou-se um motivo de interesse acrescentado saber por Misericórdia como as crianças se sentem ao serem tratadas infantilmente - isto é, do modo que os adultos acham que é apropriadamente infantil e que, muitas vezes, não está adaptada à realidade da criança que têm na frente.

Conseguimos ter esta perceção, porque um idoso sabe exprimir-se e exprimir as suas emoções, tem um vocabulário muito mais vasto do que uma criança, já teve a experiência de ser tratado com dignidade e pode, por isso, fazer comparações.

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Pela minha parte, durante a releitura deste livro, eu tive a experiência da minha infância maltratada a vir à tona. Por exemplo, quando as pessoas não ligam ao que D. Alberti diz (p. 23 e 24).  Ou quando tentam «derrubar a minha alegria.» (p. 32) Etc., etc. Aí estava, pois, a raiz do meu desconforto. Vivido, é certo, com a arte de Lídia Jorge. Porque, como nos diz Vergílio Ferreira, grande leitor e admirador da obra de Lídia Jorge:

(...) Os sinais da vida, na obra de arte, não se anulam: transpõem-se a uma certa universalidade, aí onde o nosso caso pessoal perde peso, importância. A minha dor concreta, transposta à arte, já não é bem minha mas do homem, e quanto menos ela é minha mais ela é válida. (...) (Espaço do Invisível- I, Arcádia, 1978, p. 28)

Penso ter tornado um pouco evidente com este meu breve exemplo que uma das maravilhas deste livro é a liberdade de criarmos literatura a partir da literatura que nos é ofertada. Por outras palavras, são várias as leituras que podemos fazer. Tanto horizontalmente, ao nível da diversidade de interpretações; como ao nível vertical, no que se refere às profundidades a que podemos aceder (por exemplo, tanto podemos ler nesta obra uma simples narrativa, como podemos ler nela um relato carregado de simbolismos).

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Uma das razões para tal nos ser permitido é que, enquanto lemos, Lídia Jorge não nos deixa “saber” o que vem a seguir. Por outras palavras, Lídia Jorge conduz-nos através de uma história que tem tudo para ser previsível, mas não é isso de todo que vai surgindo aos nossos olhos.

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Por outro lado, ela vai-nos contando episódios da vida da narradora, mas também inclui muitas reflexões, enriquecendo-as de emoções por virem a propósito desses episódios. E isso leva-nos a ser mais diretamente estimulados a refletir sobre essas ideias.

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Finalmente, Lídia Jorge não explica quase nada, nem a propósito do que acontece, nem do que faz as pessoas agirem como agem. Ou seja, chegamos ao fim do livro, e aquilo que é misterioso no ser humano fica retratado, mas não desvendado. Permanecendo este mistério sobre o humano no nosso espírito, mesmo muito depois de termos acabado de ler esta obra.

Invoco as seguintes palavras de Vergílio Ferreira (Espaço do Invisível- I, Arcádia, 1978, p. 14), que parecem propositadamente escritas sobre Misericórdia:

Não persiste alguma coisa de não limitado, para lá do que em obra se limitou?

E a resposta, no que se refere a esta obra, é naturalmente uma clara concordância! Continua ainda Vergílio Ferreira:

Impulso para um mais que ainda não é – e que enfim nunca será – isso que da obra sobeja «é» o homem também e decerto o que o define pela sua parte  mais alta, a mais viva (…) Mas é porque a verdade dela a supera até ao invisível, é porque alguma coisa de mais vasto a envolve, é porque uma voz única e obscura subjaz a toda a palavra audível, é por isso que, esgotado o círculo mais visível, (…) 

nos lançamos uma e outra vez à procura desse imediatamente invisível e desse quase inaudível, para responder com toda a nossa humanidade ao apelo que deles provém.

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Portanto, a primeira leitura que fiz foi relativamente rápida. A segunda foi bem mais lenta (como esta obra nos solicita, embora sem o impor), o que me permitiu assim descobrir muita coisa que me tinha passado despercebida na primeira leitura.

Para dizer que este livro existe também como um cometa lento. Ele passa, mas nós ficamos permanentemente presos na sua cauda, no rasto que ele deixa no nosso espírito. E essa luz jamais nos abandona. 

Por isso serei claro: não tenho dúvidas nenhumas em afirmar que Misericórdia é uma obra extraordinária! Uma obra que teve um tal impacto em mim que acabei por ficar a amá-la profundamente, sentindo que tenho nela uma amiga íntima para sempre.

Até por causa da forma como vivi a leitura deste livro e das interpretações pessoais que fiz. Na verdade, fui sentindo sobre mim, especialmente sobre o meu passado, ou a minha criança antiga, o olhar misericordioso da autora. Passou a suceder-me, então, quando me enleio em estados de espírito mais desolados, quando preciso de um outro conforto, imaginar-me a encostar-me a este livro e a fechar os olhos como uma criança que adormece ao colo de sua mãe.


sábado, 17 de dezembro de 2022

Misericórdia - O Título

 

(foto tirada da Wikipedia, Parable of the Good Samaritan, de Samuel Nixon)

Feita a apreciação geral de Misericórdia, passemos a um olhar mais virado para alguns dos muitos pormenores que estimularam a minha reflexão e o meu encantamento.

Comecemos, então, pelo título. Não vou repetir o que a autora disse sobre ele (e de que, aliás, só tomei conhecimento após ter feito as reflexões que se seguem).

Ao longo da minha primeira leitura, confesso que não percebi a razão de ser do título. Apesar de Lídia Jorge se referir muitas vezes ao carinho e à bondade de algumas e de alguns cuidadores para com D. Alberti e outros pensionistas.

Porque o que se me foi revelando ao longo dessa primeira leitura como mais saliente foi a resistência de D. Alberti contra os assaltos à sua dignidade: 

  • por parte do seu corpo (ter de ser lavado, deslocado de um lado para o outro, etc. por outros); 
  • por parte da mente (ao sentir vergonha, humilhação, raiva, tristeza, etc.); 
  • e, principalmente, por parte dos outros (em que avulta, entre muitos, o episódio do fotógrafo).

Mas, depois, na segunda leitura, duas associações me surgiram enquanto meditava na razão de ser do título. Registo-as aqui, apesar de saber que muito provavelmente outros as terão também feito.

A primeira foi a parábola do Bom Samaritano que aparece apenas no Evangelho de São Lucas (10, 25-37). O episódio onde surge esta parábola vale a pena ser descrito (segui a tradução feita por Frederico Lourenço; mas uma tradução alternativa pode ser encontrada aqui).

A uma dada altura, um doutor da lei pergunta a Jesus Cristo como pode herdar a vida eterna. Jesus responde-lhe com uma pergunta (esta é uma técnica educativa muito eficaz usada a fim de ser o próprio inquiridor a descobrir a resposta e a dá-la, o que proporciona uma melhor aprendizagem).

Assim, o doutor da lei responde que é amando Deus de forma total e é também, amando «ao próximo como a ti mesmo.» Jesus aprova e diz-lhe para ele fazer isso mesmo. No entanto, o doutor da lei tem ainda uma dúvida que me parece bem interessante (e que, aliás, vai assim dar origem àquela que é uma das mais belas histórias da Bíblia): «E quem é o meu próximo?»

Jesus responde com uma narrativa pois sabe também que essa é uma maneira excelente de mostrar uma ideia que não é simples; e de levar a que ela fique retida mais facilmente na mente de quem está a ouvir.

Jesus, então, conta como um judeu, que foi assaltado e deixado a agonizar na estrada, não teve qualquer ajuda nem de um sacerdote nem de um levita que por ali passaram. E é um samaritano, pertencente a um povo que tinha relações muito tensas com os judeus, que vai evitar que ele fique ali a morrer.

Este episódio chega ao fim com Jesus a perguntar qual daqueles três homens terá sido o próximo do judeu ferido. E o doutor da lei responde com honestidade: “O que praticou misericórdia com ele”. 

Exatamente: a palavra usada é misericórdia

É irresistível pensar no ambiente do romance em que há aqueles que têm a miséria do corpo ou do espírito do seu lado. E os que têm a função de cuidar dessas pessoas para que a sua miséria não seja uma condição pelo menos tão penosa. O que se vê nesta narrativa é que alguns cumprem a sua função, mas sem humanidade; enquanto outros fazem-no precisamente com misericórdia. No sentido em que é definida pelo Papa Francisco da seguinte maneira:

A palavra «misericórdia» é composta por dois vocábulos: miséria e coração. O coração indica a capacidade de amar; a misericórdia é o amor que abarca a miséria da pessoa. É um amor que «sente» a nossa indigência como se fosse sua, com a finalidade de nos libertar dela. (…)

Uma definição que serve, juntamente com a parábola do Bom Samaritano, como um pano de fundo perfeito para esta magnífica obra de Lídia Jorge.


quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Misericórdia - O Diálogo

 

(Foto de Tony Luciani - Dining With Her Self)


Vou terminar esta minha apreciação do livro Misericórdia, de Lídia Jorge, fazendo alguns comentários a alguns dos conteúdos que me suscitaram interrogações e vontade de dialogar com a autora e com as personagens. Por isso, não estarão aqui muitas passagens que também tiveram um impacto fortíssimo em mim, que me deixaram maravilhado… mas silencioso, a compreender e a assimilar! Naturalmente que essas passagens constituem um número incomensuravelmente maior do que as que aqui exponho.


(41/2)

(…) quis, então, saber um pouco da minha vida, mas eu não lha iria contar. Nem eu quis que me contasse a sua. Sou muito velha, sei que o encantamento deve ser conservado em seu próprio vaso, de contrário transborda e desfaz-se em nada. (…)

Ou seja, não deixar avançar a intimidade, mas num contexto muito particular, o da literatura. Pergunto-me se esta ideia não se aplicará àquela que deve ser idealmente a relação do escritor com o leitor.


(42)

Veja-se como Lídia Jorge descreve o efeito que a leitura em voz alta tem sobre o ouvinte e sobre a relação entre os dois: cria uma relação afetiva a partir do zero, ou reforça-a, se ela já existe. Não menos importante, contribui para transformar o feio em bonito. Em suma, quando quisermos alcançar estes efeitos, leiamos para os outros.

Eu e a minha mulher fazemo-lo. Neste momento, ela lê-me a Eneida, de Virgílio; e eu leio-lhe Contos, de Vergílio Ferreira. Um prazer imenso.

Ainda nesta mesma página, Lídia Jorge descreve os efeitos maravilhosos de uma segunda leitura (o que faço muitas vezes e fiz com Misericórdia, como já disse).

Ainda mais um pormenor: sei qual é o livro, e o conto, a que a autora faz referência. Porque é um dos livros de referência na minha vida. E que tem sido ao longo dos anos uma prenda minha para muitas pessoas, nomeadamente jovens. Porque Luís Sepúlveda mostra como qualquer pessoa, por mais modesta e insignificante que seja neste mundo, pode ser alguém verdadeiramente especial. Salve, Professor Gálvez, na obra As Rosas de Atacama.


(70)

(…) Não é possível dispor de um objecto secreto onde tudo é visto e revisto, pesquisado e inventariado pelos olhos dos outros, pois aqui onde me encontro nenhum canto é meu, nenhum objecto me pertence, até mesmo o meu corpo não é mais um recanto privado da minha alma (…).

Sempre este (quase) perfeito paralelismo entre idosos e crianças. Só que se isto fosse descrito por uma criança, nestes mesmos termos, não acreditaríamos nem perceberíamos. "Coisas de crianças!", diríamos. Muito possivelmente devido aos imensos preconceitos que mantemos em relação às crianças. Reflicto que, se é verdade que muitos de nós já evoluímos em relação a outros grupos de pessoas, quanto aos preconceitos relativos às crianças ainda temos um longo caminho a percorrer.


(73)

Mas hoje foi um dia simplesmente belo. (…) aprendi que uma alma que se eleva, eleva o mundo. (...)

Estou tão, mas tão de acordo!

É preciso sublinhar que este é um livro também sobre a beleza. Sobre como a criar e como a manter. Eu avanço com a sugestão de que este percurso pode ser iniciado lendo livros como este. E, depois, fazendo qualquer coisa, por mais simples que seja:

(…) Porque nós não mandamos no conjunto das nossas feições, nascemos ou não nascemos harmoniosos, não mandamos em nós, mas na composição dos objectos, sim, podemos mandar.

Sim, mandamos pouco em nós, uma vez que se sabe atualmente que:

Na verdade, cerca de 98 por cento do que os nossos cérebros estão a fazer está abaixo do nível de consciência. [George Lakoff, Don’t Think of na Elephant (2014), p. xi]

Praticamente, não mandamos nas nossas emoções, mandamos pouco nos nossos pensamentos, mandamos alguma coisa nas nossas ações, e mandamos algo mais nos objectos exteriores, ou seja, nos contextos em que nos movemos. É, portanto, nestes que devemos começar por intervir a fim de criar e aumentar a beleza do nosso mundo. Sem deixar de cuidar das nossas ações, pois elas influenciam profundamente quer os contextos em que vivemos, quer os nossos pensamentos e as nossas emoções.


(109)

São muitos os exemplos de falta de misericórdia que aparecem neste livro. Eu diria que servem para nos chamar a atenção para a necessidade que todos temos dela. E para as situações e pessoas que mais dela precisam – idosos e crianças. 

Sim, volto a este aspeto: as personagens deste livro são velhos. Mas reparemos na reação da filha de D. Alberti na página 83, e temos ali uma criança a reagir ao mondar das «ervas bravas», segundo palavras da mãe. Note-se que a filha reage assim porque a mãe trata-a como uma criança, não lhe deixando muita liberdade para ela poder ser adulta. Quantas vezes tratamos as crianças como crianças mais infantis e, depois, surpreendemo-nos quando elas reagem demasiado infantilmente!


(115-117)

Comovente autorretrato da filha escritora. Até que ponto Lídia Jorge real se identifica com Lídia Jorge escritora e esta com a personagem da filha? Creio ser esta talvez uma curiosidade legítima do leitor. No entanto, isso não significa que me pareça que o leitor tenha o direito de invadir com esta pergunta a privacidade de Lídia Jorge. Portanto, não penso alguma vez perguntar-lhe isto.


(129)

Aqui se mostra o poder profundo, e que perdura, das palavras. Em particular, dos rótulos pessoais. E, principalmente, das metáforas também pessoais. Às vezes, somos descuidados com o que dizemos. Muitas vezes, não nos apercebemos do impacto que temos sobre a vida dos outros apenas pelo que dizemos, especialmente se for negativo.


(141)

(…) Agora, atenho-me a um breve recado, duas linhas mal anotadas, (…)

Falar e escrever são duas atividades diferentes. D. Alberti fala e, depois, escreve um pequeno texto.

Falar pode ser para desabafar, para aliviar o peso da vida, para “espantar males”, às vezes para esquecer. Também se pode falar para aprender, o que também se pode fazer com a escrita. Esta serve também para registar, para tornar definitivo, para estarmos mais presentes na expressão do que pensamos e sentimos (falar acaba por ser mais “aéreo”).

Assim, percebi neste ponto que, escrevendo, D. Alberti não tem de fazer sentido para ninguém, mas apenas para si mesma. E que estes textos podem ser gritos interiores que D. Alberti em voz alta não se atreveria talvez a dar.


(144)

(…) mentir pelo amor deles, mentir para salvar a decência das suas vidas. (…)

A ética nem sempre depende da qualidade dos atos em si, despidos do contexto em que nascem. Mentir pode muitas vezes ser um ato profundamente ético.

Já agora, acredito que é a ética que dá uma grandeza insuspeitada a quem ocupa os degraus mais desamparados e mais baixos da escala social. Como acontece com D. Alberti, cuja resistência nasce dessa ética a que ela aderiu, possivelmente para se manter elevadamente viva.

Resistência muito patente num dos meus capítulos preferidos, Na Fila (172). Ou seja, fora da fila, de todas as filas. Sem autoridade, mas sem desistir, embora com tristeza, que é como deve ser. D. Alberti é “castigada”, mas não diz nada, não chora… Quantas crianças procuram também deste modo preservar as últimas réstias de dignidade que os adultos lhes procuram roubar?

Sim, às vezes há que escolher entre viver bem e viver com dignidade - D. Alberti procura, à custa de uma luta árdua, optar sempre por esta última.


(184 e 185)

«(…) Como sabem, eu chamo-me Débora, e estou aqui para falarmos de alegria…» Eu senti-me triste, sem ter razão de quê. A psicóloga continuou (…)

Porque o forçar a positividade, seja de que forma for, tem o efeito paradoxal de muitas vezes evocar e tornar presentes os sentimentos mais negativos. É um fenómeno muito estudado na psicologia, principalmente depois do “boom” das “afirmações positivas” de há alguns anos (a ciência descobriu que elas raramente funcionam no sentido esperado).


(188)

A psicóloga Débora falha porque ela, tal como muitas vezes fazemos com as crianças, não pergunta o que as pessoas querem ou desejam. Ela assume que sabe o que é melhor para elas e impõe a sua agenda… na qual não há ninguém que esteja interessado. Veja-se também como o capítulo 45 – O Fotógrafo (272) mostra o mesmo.


(210)

(…) Ainda que de modo diferente, por certo todos pensávamos que a situação demonstrava a dimensão da nossa dependência, a revelação da nossa fragilidade. (…)

Todo este livro, em particular aqui, evidencia a interdependência entre seres humanos. Aqui fala-se dos idosos no lar, mas esta realidade estende-se a todos os seres humanos e a toda a Natureza. A visão meritocrática de uma sociedade esconde isto dos nossos olhos. 

Assim, a pessoa que acredita na meritocracia pensa que o mérito é individual e não depende de outras pessoas nem dos recursos que são postos à sua disposição (e pelos quais ela nada teve de fazer ou de comprar para os obter). Esta visão é profundamente errada e catastrófica para a saúde de uma sociedade. Porque, entre muitas outras razões, isola as pessoas e esgota os recursos.


(254 e 255)

Porque eu mesma havia terminado a conversa e quebrado o riso? Porque os tinha mandado embora? (…) Quebrei os risos e sinto que destruí a minha felicidade. (…)

Porque lidamos tantas vezes mal com a alegria? Será que sempre lidámos mal com ela? Não é a alegria um atrator e um repositório para todos os benefícios? Que mal tem ela?

Que os poderosos abominem a alegria, percebe-se: ela escapa ao seu controlo e é subversiva.

Mas nós, cada um de nós, o que se passa quando, por exemplo, fechamos a cara à alegria de uma criança? Ou nos escandalizamos quando vemos um adulto ou um idoso alegres, e rapidamente atribuímos a sua alegria a um consumo excessivo de álcool?

Que característica, que qualidade foi destruída dentro de nós, para termos deixado de ser capazes de reconhecer a alegria pelo que ela é de facto, ficando em consequência incapazes de a fazer nossa também?

Estas são as interrogações que acrescentamos às interrogações angustiadas de D. Alberti. Sem termos uma resposta satisfatória.


(376) 

(…) Como se eu merecesse, tinham misericórdia de mim. Eu aceitava. (…)

(445)

(…) Misterioso é o sentimento da misericórdia, não tem hora marcada para entrar ou sair do ser humano. (…)


Misericórdia - uma obra deslumbrante que, mesmo passado muito tempo depois de ser lida, fica para sempre no nosso espírito, não o abandonando mais.


quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Em Todos os Sentidos - 31

 

(Imagem tirada de FLAN Colectivo)


31 ~ A Outra Face da Lua

As coisas passaram-se assim – Estávamos no Inverno de 2014 quando vários moradores da Avenida de Roma foram alertados para o projecto de venda e extermínio do Cinema Londres. (…) (194)


Sim, muitas pessoas desistiram dos cinemas.

Tive a experiência, durante vários anos, de salas quase vazias. E, algumas vezes, até de o gerente me vir pedir para sair (com a restituição do preço do bilhete) porque era o único espetador presente na sala.

Às vezes perdemos coisas (e pessoas também) porque não cuidámos devidamente delas. Depois, quando elas desaparecem da nossa vida, deixam um vazio e uma mágoa que não passam (mesmo quando interiormente conseguimos despedirmo-nos delas).


(…) Nós que não arriscávamos nenhum dinheiro, nenhum património, (…) (194)

Para além do que Lídia Jorge quer dizer nesta crónica, eu avanço o pensamento seguinte: não será que o valor que realmente damos a uma causa mede-se também pelo que estamos dispostos a arriscar por ela? Assim: o que é que eu estou disposto a arriscar neste momento por esta causa?

Esta foi a questão que se me levantou quando os professores corriam o risco de incorrer num processo disciplinar por desobedecer a ordens diretas do governo de José Sócrates; nomeadamente, ao não entregar a primeira fase do processo de avaliação competitiva que ele impôs. Acabei por decidir não entregar. Aquilo por que eu lutava valia esse risco.

Na altura, a minha autoestima estava muito baixa e, quando fui avisado de que se me iria abrir um processo (acho que de averiguações, já não me lembro), achei que não teria forças para lhe fazer frente (principalmente, porque a esmagadora maioria dos professores entregou, tendo desistido da luta, pelo que me senti muito sozinho e perdido). Decidi, então, vir-me embora e começar uma nova vida do princípio, isto é, decidi tentar conseguir uma vida mais digna e mais humana. Sim, penso muitas vezes nas professoras e professores que ficaram. Porque, quando se desiste da luta, está-se perdido.


(…) Não se conseguiria nada. O Londres foi vendido (…) (195)

É o resultado mais comum das nossas lutas. E não nos devemos desiludir demasiadamente quando isso acontece. Aqui talvez haja uma interrogação importante a fazer:

Qual a força dos cidadãos comuns perante o poder político e económico – especialmente quando ambos coincidem (o que acontece excessivas vezes para a saúde da democracia) e têm à sua frente a polícia e a GNR a apoiá-los?

Resposta: Apenas e unicamente aquela força que o dito poder permite ter, nem mais uma gota.

Suspeitei disso com as manifestações inúteis de milhões de pessoas em todo o planeta contra o início da 2ª Guerra do Iraque. Aprendi definitivamente com as manifestações inúteis de milhares e milhares de professores contra a avaliação competitiva. 

Em ambos os casos, o tempo tem vindo a dar razão às pessoas que se manifestaram (na verdade, infelizmente, dado o sofrimento que se causou e continua a causar). Mas o poder claramente ganhou o que queria.

Não quer isto dizer que não devamos tentar lutar. Às vezes, aquele poder tem fracturas, ou seja, não é absolutamente monolítico. Outras vezes, a vitória do poder é uma vitória de Pirro, isto é, pode acabar por constituir a antecâmara da sua derrota (ainda que tal coisa possa levar anos).


(…) um saco de lembranças construtoras que em vez de terem ficado nas costas, levamos adiante iluminando a vida que está por vir. (…) (196)

Lídia Jorge formula na perfeição este tema das memórias magoadas que todos nós transportamos connosco. 

A ideia é não olharmos excessivamente para trás, pois não é para esse lado que queremos ir (ou, aliás, que não é na realidade para onde estamos mesmo a ir, quer queiramos quer não). É preferível, como Lídia Jorge sugere, que as nossas lembranças, para serem construtoras, iluminem o caminho que vamos criando no nosso dia a dia.


(…) Por isso, ecléctico, filósofo, leitor de ficção e de poesia, Betâmio de Almeida apela aos grupos da ética e do direito, aos políticos, cientistas e engenheiros, para interpretarem bem os desejos da humanidade em vez de criarem necessidades que lhes são adversas. Betâmio é um recuperador da esperança. (…) (199)

Perfeito. Que eles possam interpretar os desejos da humanidade a partir de uma estrutura humanista e em função dos interesses mais autênticos desta. Não em função de interesses económicos e políticos, talvez bons no imediato para uma minoria, mas destrutivos para todos, pelo menos no médio e longo prazo. Ah, e não esquecendo nunca o papel central que os economistas desempenham nestas matérias.

Uma nota: o professor doutor Betâmio de Almeida foi o meu mestre na disciplina de Hidráulica no Instituto Superior Técnico, no início dos anos 80 do século passado. Já me esqueci de muitos professores dessa altura, mas do professor Betâmio lembro-me bem, nomeadamente da sua forma tranquila e clara de dar as suas aulas.


(…), fomos assistindo em directo ao desastre. (…) 

(…) um projecto que perdemos, perdeu a comunidade inteira, (…) (195)

Sim, esta é a crónica de uma luta. É também sobre a derrota de uma comunidade. Que pode ter trazido lições individuais, umas construtivas (por exemplo, Lídia Jorge fala-nos destas, no seu caso pessoal), outras destrutivas (provavelmente, seriam as que eu tiraria, dado o meu pessimismo no pensamento, embora não tanto na ação).

Não sabemos se teve consequências construtivas para a comunidade. Por exemplo, com o saber adquirido, pode ter dado origem à organização de novos grupos comunitários para a preservação do que tem valor e não tem preço, contra a fúria destruidora dos diferentes poderes.

Ou, como sucedeu a Lídia Jorge, pelo menos talvez se salvem alguns relacionamentos. Será suficiente? Talvez não, mas já é muito bom.


(...) Tenho para mim que o seu equilíbrio resulta do saber hidráulico.


Em Todos os Sentidos - 32, a

  (foto tirada do Jornal de Notícias de 24-01-2023 ) 32 ~ A Rapariga dos Fósforos Pertenço a uma geração de crianças que leram A Rapariga do...